Por Jaqueline Sordi
Novembro, 2023 - Estima-se que cerca de 3,9 milhões de mortes por complicações do diabetes tipo 1 desde o fim do século 19 poderiam ter sido evitadas com acesso a informações de qualidade e tratamento. Essa foi uma das conclusões de um relatório publicado em 2022 pela Juvenile Diabetes Research Foundation (JDRF, ou Fundação de Pesquisa sobre Diabetes Juvenil, em tradução livre), uma organização não governamental internacional que se dedica a pesquisas sobre a doença. No Brasil, acredita-se que o número de vidas perdidas de 1890 até hoje pela falta de diagnóstico chegue a 235 mil.
Ao coletar dados em 201 países para avaliar o impacto do diabetes na saúde pública, a partir de uma ferramenta de simulação inédita que contou com a colaboração de mais de 500 endocrinologistas, o estudo mostrou que a desinformação é um dos principais fatores que levam pessoas a ignorar sintomas ou a descontinuar orientações médicas.
O que é diabetes?
Diabetes é uma doença crônica que afeta a forma como o corpo regula os níveis de açúcar no sangue. Ela é causada pela ausência, produção insuficiente ou pelo mau funcionamento da insulina, o hormônio que facilita a entrada da glicose nas células para ser transformada em energia. Existem quatro tipos principais da enfermidade, sendo o 1 e o 2 os mais comuns. No primeiro, o corpo deixa de fabricar insulina ou o faz de forma insuficiente. Já no segundo, chega a produzir esse hormônio, porém, em quantidade também insuficiente para vencer a resistência à sua ação.
Somente no Brasil, o diabetes acomete cerca de 20,7 milhões de brasileiros, segundo dados da edição de 2023 da Pesquisa de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), do Ministério da Saúde (página 104).
Por ser uma doença complexa e multifatorial, ela também é alvo de muita desinformação, o que gera confusão em pacientes que precisam fazer um controle diário do índice de glicose no
sangue. A Lupa ouviu especialistas para derrubar alguns dos principais mitos sobre a enfermidade. Confira:
1 - “Insulina engorda”
A insulina é um dos medicamentos mais eficazes para controlar os níveis de açúcar no sangue, independentemente do tipo de diabetes. Descoberta em 1921, é hoje sintetizada até em laboratório. Quando administrada da forma correta, seja por meio de agulhas, canetas ou bombas, não só não engorda como salva vidas.
De acordo com o endocrinologista Fernando Valente, da diretoria da Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD), a insulina produzida normalmente pelo organismo tem como principal função regular o metabolismo de nutrientes ao permitir a entrada da glicose nas células, onde a substância será usada como energia.
Não fazer atividades físicas e comer em excesso são as causas diretas do ganho de peso. O uso de alguns tipos específicos de insulina, no início do tratamento, pode até engordar, mas porque o paciente havia perdido peso com o desenvolvimento da doença e, a partir do uso do hormônio, consegue recuperá-lo.
Em outras situações, a insulina tende a engordar apenas quando é administrada em doses elevadas e sem a adoção de uma dieta adequada. “Nesses casos, pode levar a um quadro de hipoglicemia (queda da glicose para valores abaixo de 70 mg/dL no sangue) e promover ganho de peso”, explica Valente.
2 - “Chá de jambolão cura diabetes”
Não há evidência científica de que o chá de jambolão (Syzygium cumini) ou qualquer outro tipo de bebida cure o diabetes. Só um tratamento adequado, alerta a nutricionista Tarcila Ferraz de Campos, do Departamento de Nutrição da SBD, vai atuar de forma eficaz no controle da doença, que não tem cura.
Quem difunde a ideia de que o chá de jambolão, feito a partir de uma planta que dá frutos semelhantes à azeitona, pode curar o diabetes afirma que a bebida tem capacidade de controlar os níveis de açúcar no sangue. No entanto, um estudo realizado por pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e publicado na revista Journal of Clinical Pharmacy and Therapeutics, em 2006, comprovou que o jambolão não possui efeito hipoglicemiante, ou seja, não funciona para reduzir a glicose no sangue.
“Os chás são bebidas bem-vindas dentro de uma alimentação saudável, mas isso não pode ser sinônimo de substituir a medicação prescrita. É preciso também ter cuidado com a quantidade de chás consumidos. Algumas pessoas acabam usando esses chás em grandes quantidades, e o excesso pode trazer complicações à saúde”, alerta a especialista.
3 - “Só pessoas com obesidade têm diabetes”
Apesar de o diabetes tipo 2 estar associado ao ganho de peso promovido pela alimentação pouco saudável e pela falta de exercícios físicos (condições que também podem levar à obesidade), pessoas magras e ativas podem desenvolver a doença. Neste caso, o risco existe especialmente para quem tem histórico familiar, origem asiática e é idoso.
O diabetes tipo 1, que representa de 5% a 10% dos casos no Brasil, é uma doença autoimune que não tem relação direta com o peso. Ela costuma se manifestar em crianças ou adolescentes, mas pode ser diagnosticada em qualquer idade, inclusive em adultos e idosos. Já o diabetes tipo 2, que representa de 80% a 90% dos casos, está relacionado a sobrepeso e sedentarismo, mas possui um importante fator genético associado.
“Embora a obesidade de fato aumente consideravelmente o risco de diabetes tipo 2, uma pessoa geneticamente predisposta pode manifestá-lo muito antes de desenvolver obesidade, quando passa a acumular um pouco mais de gordura no abdome. Muitas pessoas podem desenvolver doenças metabólicas ainda com peso normal, mas acima do que o seu próprio organismo consegue lidar”, afirma o endocrinologista Fernando Valente.
4 - “Diabetes é doença de idosos”
De acordo com o Atlas do Diabetes da Federação Internacional de Diabetes (IDF), somente cerca de 25% das pessoas com diabetes no mundo têm mais de 75 anos. O mito de que apenas
no fim da vida pode-se desenvolver a enfermidade deriva do fato de que o envelhecimento é considerado um fator de risco para o diabetes tipo 2.
A cada ano, o organismo perde um pouco da capacidade de produzir insulina, quadro que tende a se agravar a partir dos 30 ou 40 anos. Mas isso não significa que somente idosos irão desenvolver a doença, muito menos que todo idoso terá diabetes. Já se sabe que é o avanço da obesidade que tem levado a um número cada vez maior de adultos a desenvolverem a enfermidade. Dados do Ministério da Saúde, divulgados pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (SBCBM), apontam que a obesidade já atinge 6,7 milhões de pessoas no Brasil.
Há preocupação especialmente entre os jovens. Uma pesquisa publicada em 2022 no jornal científico The BMJ, do Reino Unido, mostrou que a taxa de diabetes do tipo 2 cresceu 56% no planeta entre adolescentes e adultos jovens (de 15 a 39 anos) no período de 1990 a 2019. A incidência passou de 117 casos a cada grupo de 100 mil pessoas para 183. O sobrepeso foi considerado o maior fator de risco, não a idade.
5 - “Quem tem diabetes não pode comer açúcar”
Pode, mas desde que mantenha um estilo de vida saudável, consuma de forma moderada e siga as orientações médicas para o controle da doença. Neste caso, de acordo com a nutricionista Tarcila Ferraz de Campos, da SBD, quem tem diabetes pode seguir uma rotina normal quando se trata de açúcar.
“A recomendação, quando pensamos em hábitos de vida saudável, é que ninguém tenha uma ingestão de açúcar branco em excesso. A alimentação da pessoa com diabetes deve seguir a mesma recomendação sobre a quantidade de açúcar que a de uma pessoa que não tem a doença. Não existe uma proibição, mas sim uma adequação de consumo e frequência.”
O doce é uma fonte de glicose. Por isso, na dúvida, é importante buscar ajuda médica para avaliar não só a quantidade como a qualidade indicadas para o consumo.
6 - “Pessoas com diabetes não podem fazer exercício físico”
Estudos científicos já comprovaram que o exercício físico é importante tanto na prevenção como no tratamento do diabetes. Para quem tem a doença, a prática regular de atividades aeróbicas demonstrou, por exemplo, capacidade de melhorar o controle glicêmico, reduzir os fatores de risco cardiovascular, contribuir para a perda de peso e aumentar o bem-estar.
De acordo com a Associação Americana de Diabetes (ADA, sigla em inglês), pacientes devem praticar pelo menos 150 minutos por semana de atividade física aeróbica de moderada intensidade. A recomendação deve ser individualizada, avaliando as características de cada paciente.
“Assim como medicamentos, exercícios em doses inadequadas podem trazer algum malefício, motivo pelo qual é importante orientar as pessoas para que façam uma atividade que seja adequada para a situação de cada um, a depender da presença ou não de complicações do diabetes”, destaca o endocrinologista Fernando Valente.
Nota da redação: este conteúdo é uma parceria da Lupa com a empresa global de saúde Novo Nordisk e tem como objetivo dar visibilidade a informações corretas sobre obesidade e diabetes.
Edição: Adriana Ferraz e Leandro Becker