Fevereiro, 2024 - O mais recente Atlas Mundial da Obesidade alerta que um quarto da população mundial sofrerá com obesidade em 2035. No Brasil, a estimativa é de que 41% dos adultos ingressarão neste grupo no mesmo período. Já se sabe que a epidemia de obesidade, doença que tem aumentado vertiginosamente em todo o mundo, traz um alto custo para a saúde da população. No entanto, mais recentemente, estudos têm apontado que ela custa cada vez mais também para o bolso dos cidadãos.
Uma das maiores pesquisas sobre o tema, publicada em 2022 na revista científica BMJ Global Health, revelou que o percentual de pessoas com obesidade ou com sobrepeso no Brasil deverá chegar a 88,1% da população em 2060, resultando em um impacto econômico de US$ 218,2 bilhões (mais de R$ 1,3 trilhão), o que representa cerca de 4,66% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. Quando comparada aos dados de 2019, que indicavam uma prevalência de sobrepeso e obesidade de 53,8% da população e um custo de US$ 37,1 bilhões (cerca de R$ 190,5 bilhões, ou 1,98% do PIB), fica evidente a dimensão do desafio em saúde pública no futuro próximo.
A publicação, que foi a primeira a apresentar uma estimativa global das implicações econômicas do sobrepeso e obesidade, mostrou que, em todo o mundo, dois em cada cinco adultos são, hoje, portadores dessas condições. O cálculo para definir se uma pessoa tem sobrepeso ou obesidade, em estudos populacionais, leva em conta a relação entre peso e altura e é chamado de Índice de Massa Corporal (IMC). Um IMC entre 25 e 29,9 é classificado como sobrepeso. Obesidade é definida como IMC a partir de 30.
Para chegar aos resultados sobre os custos da epidemia em cada país, o grupo de pesquisadores levou em consideração gastos diretos e indiretos, considerando as 28 enfermidades associadas a sobrepeso e obesidade segundo o Global Burden of Disease (GBD), como vários tipo de câncer, hipertensão, problemas cardíacos, entre outros. Entre os custos diretos estão os médicos e os econômicos advindos do processo de busca por cuidados de saúde; entre os indiretos, estão as perdas econômicas ligadas à mortalidade prematura, ausência no trabalho e queda da produtividade. Foram analisados 161 países, e as estimativas consideraram uma linha do tempo que inicia em 2019 e termina em 2060.
Os resultados do estudo vão ao encontro de outras análises que já apontavam para um crescimento vertiginoso nas taxas de obesidade do Brasil e outros países. Entre elas, o endocrinologista Bruno Gelozene, professor de endocrinologia na Unicamp e membro do Comitê Científico da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Sindrome Metabólica (ABESO), destaca os dados da World Obesity Federation, que apontam que em 2035 os gastos com essa condição no país já alcançarão 3% do PIB.
“Mesmo assim, temos que lembrar que os custos com obesidade são sempre subestimados porque existe uma dificuldade no diagnóstico tanto do sobrepeso como da obesidade, e muitas vezes temos nos registros dos sistemas de saúde, tanto públicos como privados, diagnósticos de AVC, infarto e outras doenças sem ter descrito se aquele paciente tinha sobrepeso ou obesidade”, afirma a endocrinologista Maria Edna de Melo, diretora do Departamento de Obesidade da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM).
Ainda que, de acordo com o Dr. Gelozene, a World Obesity Federation classifique o Brasil como um país com capacidade suficientemente boa para lidar com a obesidade em seus sistemas de saúde, as previsões sobre o crescimento da doença no país preocupam especialistas. A endocrinologista Dra. Maria Edna de Melo, ressalta que os sistemas público e privado do país não estão preparados para cuidar desses pacientes nem para suportar o impacto econômico da obesidade. “Como isso [a obesidade] é algo em crescimento, não temos a menor noção de como será no futuro. Não é como em outros países, como por exemplo o Reino Unido, que já estão mais à frente no sentido de elaborar políticas públicas para o controle da obesidade”, destaca. Desde 2016, o governo britânico tem traçado estratégias para reduzir os índices de obesidade infantil com o objetivo de melhorar a saúde pública de sua população. Entre as iniciativas estão campanhas de educação, o aumento de impostos sobre refrigerantes e, mais recentemente, os diferentes tratamentos para a obesidade para milhares de pessoas.
A preocupação sobre o despreparo do sistema de saúde brasileiro com a epidemia de obesidade também é destacada pelo cirurgião bariátrico Denis Pajecki, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). “As políticas de prevenção de aumento da obesidade não estão sendo efetivas até o momento. Políticas recentes, como a rotulagem de alimentos talvez passem a ter impacto em um futuro próximo, mas por enquanto o que vemos é um aumento crescente na prevalência de obesidade da população”, destaca.
A questão da prevenção, que inclui a conscientização sobre a importância de hábitos alimentares saudáveis, é fundamental porque, de acordo com Pajecki, a obesidade cresce mais no Brasil entre as classes C e D, onde tem aumentado também o consumo de alimentos ultraprocessados, devido ao seu preço mais baixo. De fato, um estudo realizado pelo Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (Nupens), da USP, publicado no ano passado no Journal of Public Health, mostrou que 28% do aumento da obesidade entre 2002 e 2009 no Brasil foi causado pelo consumo desse tipo de alimento.
A relação entre os ultraprocessados e a obesidade fica evidente também no estudo publicado na BMJ Global Health, que mostrou que parte dos países que tinham as taxas mais altas de obesidade eram aqueles com renda média - e não os países ricos. Não à toa, pesquisas têm apontado que nações mais pobres estão enfrentando altos níveis de obesidade e de subnutrição ao mesmo tempo, como é o caso do Brasil. De acordo com o 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan), o número de brasileiros que passam fome saltou de 19,1 milhões em 2020 para 33,1 milhões neste ano. A pesquisa mostrou que mais da metade (58,7%) da população brasileira convive com a insegurança alimentar em algum grau – leve, moderado ou grave (fome).
Apesar de graves, as projeções sobre o aumento da obesidade no país ainda podem ser revertidas. Para tal, destacam os especialistas, é preciso priorizar e investir em um conjunto de medidas, como incentivo à alimentação saudável e à prática de exercício, que combatam o avanço da doença já na raiz. “O caminho para reverter isso está na infância, na escola. Por um lado, está na melhora da alimentação, na taxação de alimentos ultraprocessados, na diminuição de impostos para alimentos não industrializados, no aumento da prática de atividade física. Por outro lado, está no investimento em tratamento precoce da obesidade com a criação de linhas de cuidado no SUS, encarando a obesidade como a doença que ela é, para que os pacientes possam ser tratados precocemente e diminuírem, assim, o desenvolvimento de comorbidades e complicações decorrentes da obesidade”, resume Pajecki.
Nota da redação: este conteúdo é uma parceria da Lupa com a empresa global de saúde Novo Nordisk e tem como objetivo dar visibilidade a informações corretas sobre obesidade e diabetes.
Edição: Helena Bertho e Luciana Corrêa
Promomats: BR24NNG00004 - JANIERO/2024
Fontes:
Atlas Mundial da Obesidade, 2023. Disponível em: https://www.worldobesity.org/resources/resource-library/world-obesity-atlas-2023
Acessado em janeiro de 2024.
Economic impacts of overweight and obesity: current and future estimates for 161 countries, BMJ Global Health. Disponível em: https://gh.bmj.com/content/bmjgh/7/9/e009773.full.pdf?with-ds=yes. Acessado em janeiro de 2024.
Economic impact of overweight and obesity, World Obesity Federation. Disponível em: https://data.worldobesity.org/country/brazil-27/#data_economic-impact. Acessado em janeiro de 2024.
Sugar Tax, Institute For Government. Disponível em: https://www.instituteforgovernment.org.uk/article/explainer/sugar-tax. Acessado em janeiro de 2024.
Changes in Obesity Prevalence Attributable to Ultra-Processed Food Consumption in Brazil Between 2002 and 2009, International Journal Of Public Health. Disponível em: https://www.ssph-journal.org/articles/10.3389/ijph.2022.1604103/full. Acessado em janeiro de 2024.
2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto
da Pandemia da Covid-19 no Brasil, Rede Brasileira de Pesquisa em
Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan).
Disponível em: https://olheparaafome.com.br/wp-content/uploads/2022/06/Relatorio-II-VIGISAN-2022.pdf.
Acessado em janeiro de 2024.